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Restos Infantis
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Há muito mimo na televisão para as crianças de hoje, aliás, há muito mimo e carinho para todas as crianças da sociedade próspera, e isso é um dano terrível ao futuro delas. Nem falo da flacidez que se cria em seus espíritos, mas da infância que resta mesmo já em passados muitos anos para além da maturidade.
As crianças de hoje em dia têm acesso a um grande número de coisas piscantes e coloridas, um sucesso incrível se tratando de oferta em atrações para o seus dias. Mas há uma semente ruim plantada em cada um deles, uma promessa que seus futuros serão baseados nessa bonança, e suas mentes darão valor à poesia ao invés da criatividade, e também haverá atração pelo caminho despretencioso ao invés do desenvolvimento compromissado e árduo.
Eu posso estar sendo ranzinza, mas eu acredito nisso, não gosto de ver meus amigos já com mais de vinte anos de idade inchando-se de saudosismos e maneirismos em relação aos seus heróis de desenhos super coloridos e super movimentados.
Estão animados a assuntos sobre graus e níveis de força em personagens esdrúxulos, sobre façanhas estúpidas como sangrar, ou então conquistar planetas mil vezes, e também proteger o mundo de inimigos cada vez mais ridículos, e os mistérios vão se esvaindo, versus a uma compilação emocional que os prometerá a sensações de que tudo será como o colorido tempo de suas infâncias.
Nessa tenra idade eles deveriam ser expostos a sensações muito mais rústicas e valiosas para o carácter, mas isso está longe de acontecer em massa, eles deveriam sentir o valor das coisas, se sujarem com a terra, e levantarem obras válidas para o grupo, mas preferem destroçar corpos virtuais, prédios virtuais, almas virtuais. É assim que está sendo criado o futuro, uma civilização acostumada a uma cultura fútil, cara e sem humanidade, um super prazer à nova poesia e estética, versus uma relação profunda com a natureza e a simplicidade do indíviduo humano.
Eu sinto muita falta de minha infância com dificuldades financeiras, pois hoje eu sei o quanto por conta disso eu tive que encontrar em outra pessoa a pessoa que eu sou hoje, mas essas crianças estão buscando serem seus heróis de bits, e os coloridos, as futilidades avançam por entre os anos, domesticando o espírito criativo na sensação de explosões, de cidades espaciais impossíveis, de inimigos cada vez mais distantes da realidade, as questões de personalidade foram substituídas por arquétipos bem claros e delineados, um mundo de personagens mentirosos mesmo quando se prometem parte de uma proposta sincera.
As crianças estão acostumando-se a sentir que o mundo delas não é o nosso mundo, cada vez mais e mais está fácil trocar o valor do chão, da terra, do ar, da água e dos ruídos naturais pela proficuidade dos artistas atuais, uma inundação de belezas desencontradas, dopando os futuros com o mesmo descompromisso chamado individualismo, ou então inabilitando os homens e mulheres de se comunicarem como seres maduros, e os levando a trocar figurinhas como no colégio.
E a inocência que antes era não conhecer os segredos maravilhosos da vida, agora é não conhecer a vida enquanto se descobre a razão de ser em todos os mistérios dela.
Mas essa traição de culturas vai tornar o mundo tão tedioso que o futuro engolirá a si mesmo, e eu vou ver a arrogância da oniência em cada criancinha cheia de palavriados sobre seus iguais com a mesma força de recharço, essas meninas e meninos prontos para desfazerem-se dos outros em nome de suas realidades cada vez mais virtuais.
E o mundo delas será ultra-compactado num formato de vídeo de super resolução, e caberá num trequinho minúsculo que toca, grava, reproduz e dança seus filminhos pretenciosos, tudo legendado ou escrito por um analfabeto metido a hacker que pode fazer o mesmo que grandes empresas há vinte anos atrás.
Uns chamarão isso de progresso, mas eu lembrarei de Prometeus e o roubo do fogo.
domingo, 23 de março de 2008 - 09:43
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